Hip Hop, Kung Fu e Tartarugas Ninja

Celebrando o lançamento do filme As Tartarugas Ninja: Caos Mutante e a colaboração entre a Redley e a franquia, chegamos com muita ideia para trocar sobre Kung Fu e Hip Hop. Vem ver!

O time de escrita, composto por Seth Rogen, Jeff Rowe, Evan Goldberg, Dan Hernandez, Benji Samit, construiu em As Tartarugas Ninja: Caos Mutante um roteiro introdutório muito assertivo. Abordar a necessidade do quarteto de interagir com a humanidade, a vontade de viver experiências humanas, como adolescentes, trouxe sensibilidade para o universo construído na obra.

As tartarugas desejam ser heróis, buscando viver em sociedade junto com os outros humanos, vontade quase utópica, que flerta com o otimismo da juventude, com o brilho no olhar, do desejo de aceitação. E por falar em juventude, Leonardo, Rafael, Michelangelo e Donatello são o Hip Hop, mas como as artes marciais, especificamente o Kung-Fu e o filme se relacionam com o movimento urbano?


A resposta é simples: a partir da música e toda sua genialidade. É notável ver no filme a completa referência ao movimento, nas linguagens e na comunicação que os personagens estão introduzidos. Essa noção pode ser vista nos diálogos, que diga-se de passagem são super divertidos, como um grande mix de Kung-Fu e Hip Hop, no mais alto estilo Wu-Tang Clan em 36 chambers. 

Wu-Tang Clan, Kung-Fu e descolonização

Líder do grupo, o produtor e rapper RZA queria levar sua fixação com filmes de Kung-Fu e artes marciais para o universo do hip hop. O nome do grupo foi inspirado pelo filme Shaolin and Wu Tang (1983), produzido em Hong Kong e dirigido e estrelado por Gordon Liu. Nota-se que ao longo dos lançamentos do grupo, falas de filmes de Kung-Fu foram utilizadas como samples em suas músicas. 

O Kung-Fu e o Hip Hop andam lado a lado. As referências que RZA projetou durante a década de 1990 contribuíram para uma febre de referências cinematográficas, quadrinhos, samples e toda uma troca cultural com a arte marcial milenar. 

“O hip-hop nasceu das cinzas de uma comunidade devastada por um sistema econômico capitalista e por funcionários racistas do governo.” – Derek Ide do Instituto Hampton. 

O Kung-Fu nasce como uma arte de disciplina, respeito, do olhar interior, do combate diário aos nossos demônios. Apesar da narrativa de consumo e capitalista que parte do rap alcançou, o gênero ainda é um ato de protesto, de busca pela autoestima e principalmente da autonomia.

Os filmes de Kung-Fu podem soar datados quando assistimos hoje, mas você não pode negar sua estética visual e acrobática, influenciando os jovens do Bronx, bairro onde nasceu o Hip Hop.

Os filmes de Kung-Fu eram mais do que apenas filmes. Eles eram uma mina de ouro em busca de inspiração e uma porta de entrada para um novo mundo. Para compreender a sobreposição temática dos direitos civis entre o Hip-hop e o Kung-Fu, precisamos entender o contexto no Oriente e no Ocidente durante os anos 60.

  • 1 – O Ocidente emergiu mancando das lutas da era dos direitos civis dos afro-americanos entre 1954 e 1968;
  • 2 – O Leste (especificamente Hong Kong) emergiu da era da ocupação imperialista japonesa (1945);
  • 3 – Ambos os mundos viveram momentos decisivos na história. Para generalizar/simplificar: (Não-brancos) Joes comuns se defendendo e derrotando uma autoridade injusta. Parece um enredo típico de filme de Kung-Fu?

Caos Mutante e a Colaboração com a Redley

As Tartarugas Ninjas seguem esse modelo, jovens, que cresceram aprendendo artes marciais, tem a força para solucionar os problemas enquanto heróis, mas ainda sim possuem suas questões, questionamentos e necessidades, como qualquer adolescente que quer se sentir pertencido. E é justamente nesse combate a vilania, à procura do herói por sua glória e consequentemente a aceitação que vem como bônus desse processo, que os quatro irmãos estão inseridos.

As Tartarugas Ninja: Caos Mutante conta a história de Leonardo, Raphael, Donatello e Michelangelo, 4 tartarugas que, após serem expostas à radiação, se tornam Ninjas que combatem o mal. O novo filme traz uma versão adolescente desse clássico dos quadrinhos, misturando humor, aventura e diversão para a família toda.


Além de ser a melhor versão das Tartarugas Ninja, Caos Mutante é na minha opinião a melhor versão da obra nas telas. Leonardo é o líder em aprendizagem, com suas inseguranças e medos. Rafael deseja desbravar e conhecer o mundo, enquanto Michelangelo se mantém como aquele personagem bobo, trazendo a leveza para a relação entre os quatro irmãos, enquanto Donatello é a perfeita representação do Nerd fascinado pela cultura Pop. Cada um desses elementos nos mostram que o grande valor da narrativa está justamente nessa sensibilidade. 

Não existe Caos Mutante sem a trilha sonora, ela é executada com precisão, não se perde na batida, além de soar como um grande balé contemporâneo onde as artes marciais e os movimentos são a luz desse processo. 

O filme trata muito bem da figura do Mestre Splinter, como o sábio, que apesar de ter ensinado tudo que sabe para as Tartarugas, ainda tem medo de vê-las serem introduzidas na sociedade, com todo o preconceito e não aceitação sobre a figura do “diferente”, traçando um forte paralelo como a vida real e a história do homem e da mulher negra nos Estados Unidos e no Brasil.  

Um detalhe interessante que não devemos deixar de comentar, está na irreverência que a collab entre As Tartarugas Ninja; Caos Mutante e Redley construíram. O moletom, os pisantes e os Bucket-hats são elementos clássicos na cultura Hip Hop, sendo esse o flerte mais inteligente da colaboração, vestir bem, de forma confortável, caracterizando o estilo a partir de uma modelagem mais larga, feita para os apreciadores do despojado ao elegante. 


Pra fechar, não podia deixar de reverenciar a escolha da fotografia, da coleção e do filme, o enredo do longa e a campanha de marketing da Redley, reforçando que o Hip Hop se conecta com o Kung-Fu enquanto movimento espiritual e político, que ainda sim está vinculado a moda, como uma ferramenta para a auto estima.

Aproveita e confira no site os produtos dessa collab, mas corre que já já eles vão esgotar.

Até a próxima!